Uma desordem total invadiu o nosso século. Em proporções
gigantescas e com indomável força ela, dia a dia, conquista os núcleos básicos
da comunidade humana.
A característica principal da forma moderna da desordem é
a inversão dos valores do convívio humano, que começa cortando os laços que
ligam os diversos escalões da hierarquia social e termina no desentendimento
total dos homens.
Na família, os filhos estão surdos para o timbre da voz
paterna. Os pais estupefatos temem os filhos. Temem principalmente perdê-los.
Com cabisbaixa fraqueza cedem às suas imposições, para não perderem aqueles que
de há muito perderam. Congrega-os o lar apenas por laços de um certo instinto
gregário e os interesses monetários dos filhos. Mas o filho já é um estranho na
casa.
Na escola, a professora condicionada por uma pedagogia
que nega a tendência da criança para o mal (tendência que é um claro indício do
pecado original) e o valor educativo das punições, docilmente cede a todos os
caprichos infantis.
Nos ginásios, os adolescentes agrupados na promiscuidade
da co-educação, iniciam-se nas “viagens do fumo” e dos tóxicos, preparam-se
para o amor nas “inocentes” práticas sexuais, sob os olhares estimulantes e
compreensivos dos orientadores educacionais.
Nas universidades, os representantes do mais tolo mito do
século, o mito do JOVEM, elaboram os programas, impõem e depõem os mestres e
dirigentes, sob o pastoral treinamento, nas universidades católicas, de
sacerdotes mais imaturos que eles e que os orientam conforme a moral permissiva
e a linha subversiva.
As nações, na desarvorada corrida para a tirânica
democratização, já atingiram, ou estão prestes a atingir, o mais que perfeito
regime da desordem institucionalizada de um Chile, de um Argentina ou dos
ensaios brasileiros pré-64.
Entre os católicos o vírus do desconcerto infiltrou-se em
proporções alarmantes. Os detentores do poder sagrado, por pusilanimidade, por
irresponsabilidade, por comodidade, por estupidez, ou, o que é mais provável,
por tudo isso junto, entregaram de mãos beijadas o governo às conferências
episcopais, às comissões de peritos, que funcionam como imensas máquinas
manipuladas pelos técnicos da pastoral. Um poder invisível, onipresente e
onipotente, age como um rolo compressor, esmagando o doce e paterno cuidado dos
pastores. Estes, submissos e silenciosos, no clima asfixiantes dos diálogos,
assinam tudo o que os secretários das linhas pastorais 1, 2, 3, etc. lhes
enviam para que livremente não deixem de aprovar. O resultado do funcionamento
dessa burocracia eclesiástica é, além das estatísticas e das verbas
astronômicas dispendidas, a orientação para uma vida cristã onde em moral vale
tudo e, em doutrina, nada vale a verdade transmitida há dois mil anos.
O princípio norteador da Grande Revolução é a quebra da
ordem pela destruição da hierarquia, da imagem do pai, do sacerdote e do
príncipe.
A subordinação
livre e consciente do homem ao homem na família, na cidade e na religião, força
propulsora da ordem e da paz, é uma continuação da subordinação ao Criador, ao
Pai Eterno. Se tudo no Universo a Deus se subordina e a Ele se relaciona como
ao Criador, desde as suas origens a criatura humana a Deus se liga como ao Pai.
Porque Deus concedeu ao homem algo do seu próprio ser, da sua própria vida: a
inteligência, pela qual penetra no mistério da essência das coisas; a graça,
num plano mais alto, que permite ao homem pela fé, nesta vida, e pela visão, na
outra, perscrutar as profundezas de Deus.
Deus é Pai porque gerando o homem pelo sêmen da graça
fá-lo ser de um modo ainda mais pleno a sua imagem e semelhança. O nome que
mais convém a Deus, enquanto fonte dessa vida divina em nós, é o de Pai. Pai
que está sempre a nos lembrar as nossas humildes origens do nada e as nossas
grandiosas origens no amor e na misericórdia divina; a nossa dependência, a
nossa fraqueza.
Em piedoso reconhecimento dessa paternidade divina, que
nos tirou do nada para o ser, de criatura, para filhos de Deus, na qual se
encontra o sentido último de toda autoridade humana, exclama S. Paulo: “Eu
dobro os meus joelhos diante do Pai, do qual toda paternidade no céu e na terra
tira o seu nome”. (Ef., 3, 14).
A Grande Desordem que contemplamos, conseqüência natural
da Grande Revolução que o “inimigo do homem” declarou contra o Filho do Homem
nos tempos modernos, tem por força motriz a desobediência. Mas desobediência
qualificada por um novo aspecto, pois quem promove agora a subversão é a
própria autoridade, como que pressionada por um inevitável impulso suicida.
Os pais pelas atitudes de fraqueza, educam os filhos para
a desobediência. Os governos tolerantes de um Frei, no Chile, de militares
fracos, na Argentina, levaram essas duas nações à desordem total. Pela tática
renúncia dos governantes ao poder, muitas outras nações caíram nas mãos da
desordem organizada dos regimes marxistas. Quem entre os católicos fala
oficialmente pregando a revolta do filho ao pai, do povo ao governo, não são os
fiéis, são os próprios membros do corpo docente consagrados para ensinarem aos
homens a piedade, a paciência, a submissão e a paz.
O processo revolucionário dirigido pelo “pai da mentira”
contra o Pai Eterno só poderá ser detido pela contra revolução dos filhos de
Deus que contemplam no superior a imagem do Pai. A mais terrível arma do “filho
das trevas” contra o Pai das Luzes é ter conseguido arrancar dos corações o
sentimento de piedade, de respeito e de amor aos pais. As palavras de S.Paulo
dirigidas para a comunidade familiar, onde a ordem social encontra a sua fonte,
poderão, com as devidas transposições, ser aplicadas a todas as esferas da
sociedade dos homens. “Filhos, obedecei os vossos pais no Senhor, porque isso é
justo. Pais, não exaspereis vossos filhos, mas educai-os na disciplina e na
correção conforme o Senhor”. (Ef., 6. 1;4).
***
Gustavo Corção. Editorial da Revista Permanência, no. 57,
Julho de 1973.
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