sábado, 30 de maio de 2020

O demônio da apostasia (Pe. Roger-Thomas Calmel)


“Todos os hereges de séculos passados, até o século XVI inclusive, afirmavam e mantinham uma Igreja distinta do mundo. (...) Jamais lhes veio ao espírito que a civilização – o circo das civilizações, como dizia o poeta -, as revoluções dos impérios, e todo o futuro da humanidade, era isso o que constituía a Igreja. (...) Os hereges antigos não tinham ainda submergido Deus e seu Cristo na história humana; confundido o Deus imutável e três vezes santo, e seu Filho encarnado Jesus, com o mundo que se organiza e a humanidade que, aparentemente pelo menos, se torna senhora dos mecanismos da matéria, da vida e da sociedade. Estas aberrações só deveriam vir ao espírito dos falsos profetas modernos. Os antigos hereges estavam em rebelião contra a fé e contra a Igreja a respeito de tal ou qual ponto de vista da Revelação, eles não eram apostatas da fé da Igreja. Eles não tinham tentado transferir a Igreja, faze-la descer, afundá-la numa esfera que não e da vida eterna, dos bens celestiais e de sua preparação aqui embaixo. Qualquer que seja a necessária iluminação e purificação das realidades terrestres pela luz e graça divinas, os antigos hereges estavam longe de pensar que o objeto próprio da fé e da Igreja consistisse nas realidades terrestres e na sua transformação. Os antigos hereges pecavam por heresia; em nossos dias é o demônio da apostasia que avança na direção dos fiéis a passos cadenciados; um grande número já começou a entreabrir-lhe a porta de sua alma”.
***
Pe. Roger-Thomas Calmel O.P. (1914-1975)Teologia da História.


Já que... (Paul Scortesco)


Paul Scortesco (1895-1976), o lúcido autor de Gog e Magog e de Satã, eis aqui a tua vitória, no seu percuciente opúsculo sobre a Falência Mundial da Hierarquia, indaga dolorosamente:

“Já que os bispos católicos e romanos consentem em que se suprimam os púlpitos, as imagens e as estátuas, como nos templos protestantes; já que eles aconselham que se renuncie ao uso da batina, como os pastores protestantes; já que eles toleram que se reduza a Presença Real a uma cerimônia comemorativa, como entre os protestantes; já que eles autorizam um catecismo sem definições doutrinárias e que se ponha em dúvida a infalibilidade, a Imaculada Conceição e a Assunção, que não existem para os protestantes; já que eles não reprimem aqueles que rejeitam completamente o latim e que tendem para a constituição de igrejas nacionais, que existem já entre os protestantes; então eu lhes pergunto, humildemente, caridosamente, por que não vão eles para onde encontrarão todas essas reformas já feitas, em lugar de se dar ao trabalho de fazer tantos esforços para introduzi-las na Igreja católica romana?”.


domingo, 24 de maio de 2020

A vida é a vigília da eternidade - Mons. Gaume (1802-1879)



I. DIAS DA SEMANA NO PONTO DE VISTA DA FÉ - o domingo é a primeira festa do Cristianismo. Acabamos de explicar por miúdo o ofício divino e o augusto Sacrifício com que a Igreja quer que seja santificado. Em certo sentido, os outros dias da semana são também festas. O universo é um templo; o homem é um sacerdote; a sua vida deve ser uma festa continua: tal é o pensamento dos Padres da Igreja.

“Dizei-me, perguntava Orígenes aos Cristãos do seu temp0, vós que não vindes à igreja senão nos dias solenes, os outros dias não são também dias de festa? Não são dias do Senhor, domingos? É próprio dos judeus o distinguir os dias. Por isso o Senhor lhes declarou que tinha aversão às suas calendas e aos seus dias de descanso. Os Cristãos, pelo contrário, consideram todos os dias como dias do Senhor, e como o mesmo dia de Páscoa, porque todos os dias o Cordeiro celeste se imola por eles e todos os dias o comem. Se o Sacrifício se fazia, segundo a lei de Moisés, ao pôr do sol, é porque a vida presente é como um dia na sua declinação, uma noite que deve ser seguida do dia do sol de justiça, ao nascer do qual havemos de entrar num oceano de alegria e numa festa eterna (Homil. X in Gen.).

Duas coisas resultam destas magnificas palavras:
1º que a Religião completada por Nosso Senhor desenvolveu toda a lei antiga, de tal sorte que, se os judeus tinham certos dias da festa, era uma sombra do que devia suceder sob o Evangelho, quando todos os dias não formassem mais que uma festa, em que os homens se abstivessem de tudo o que pode ofender a Deus;
2º que as festas e a mesma vida inteira não são mais que um tirocínio da festa do Céu; que o tempo é a vigília da eternidade, pois que não é senão em vista da eternidade que é dada a vida ao homem, o tempo a0 gênero humano, e que podemos sempre alimentar-nos da carne ou da palavra do Verbo encarnado, da qual a gente se alimenta também no Céu.
Insistindo nesta bela ideia de que a vida não é mais que uma longa festa em que devemos ser santos e piedosos como nas solenidades particulares, continua Orígenes nestes termos:

 “O Cristão  que tem inteligência da sua Religião, está persuadido de que cada dia é para ele um dia de domingo, um dia do Senhor ao qual unicamente liga o coração e os pensamentos; de que cada dia é para ele uma sexta-feira, e até uma sexta-feira santa, porque doma as suas paixões e recebe na sua carne as impressões da cruz de Jesus Cristo; de que cada dia é para ele um dia de Páscoa, porque continua incessantemente a separar-se deste mundo de corrupção e a passar ao mundo invisível e incorruptível, alimentando-se da palavra e da carne do Verbo humanado; finalmente, de que cada dia é para ele um dia de Pentecostes, porque ressuscitou em espirito com Jesus Cristo, elevou-se com ele até ao Céu, até ao trono do Pai, onde está assentado com Jesus Cristo e em Jesus Cristo, pelo qual recebe a plenitude do Espirito Santo” (Contr. Cels., 1. VIII).

Todos os dias do ano são, pois, dias santos, dias de festa.

“Mas, acrescenta o mesmo Padre, como há muitos cristãos que não querem ou não podem resolver-se a passar toda a vida como um só dia de festa, foi preciso, para acomodar-se à sua fraqueza, determinar festas particulares. Na sua maternal solicitude, as estabeleceu a Egreja para que os mais dissipados e os mais languidos pudessem adquirir nelas novo vigor, desembaraçando-se, ao menos por um pouco de tempo, dos negócios deste mundo. Todavia não são essas, segundo a expressão de S. Paulo, senão partes de um dia de festa, dessa festa contínua que os justos celebram toda a sua vida e que os bem-aventurados hão de celebrar na eternidade” (2 - Id., 1. VIII; Hieron., in Epist. ad Galat., c. IV.).

Tal é a sublime ideia que o Cristianismo, pela boca dos seus doutores, nos dá do mundo e do tempo. O mundo é um templo, a vida é uma festa, mas uma festa em que o homem decaído procura reabilitar-se. Para caracterizarem a vida do Cristão sob o Evangelho, acrescentam:

“É uma verdade igualmente importante e incontestável que o culto religioso da Divindade teve mais extensão e liberdade, e se deixou limitar menos a tempos, a anos, a semanas, a dias, a lugares, a templos e a altares particulares no estado de inocência e nos séculos que o seguiram de perto que nos subsequentes. Sabe-se por quantas leis e prescrições era embaraçado sob a lei mosaica. A Igreja ocupa o meio termo entre a sinagoga e o céu ou o estado de inocência. Sob o Evangelho estamos, pois, como em um estado intermediário, em que se recobra a primitiva inocência, mas em que não se recobra inteiramente. Ainda mais, esperamos na vida futura uma liberdade mui outra que a do primitivo estado, porque nela será Deus por si só o nosso templo, e nós o seremos seu. Entraremos na sua alegria e no seu descanso, dos quais não terão sido senão sombras todas as festas do estado de inocência, da sinagoga e da própria Igreja. Nas festas deste mundo, traça Deus em nós, pela justificaçã0, a imagem da nossa primitiva pureza, bem c0mo da liberdade e felicidade em que criara o homem. Desse modo põe em nós alguns traços da santidade e liberdade perfeitas que nos prepara no céu. Os justos, pois, participam agora do primeiro e último estado da santa liberdade dos filhos de Deus” (Clem. Alexand., Strom., 1, VII, n. 512.).

Mas como havemos de fazer da nossa vida terrestre uma festa continua? Como celebrá-la dignamente? É preciso, segundo o pensamento dos santos Padres, lembrar-nos de que toda a duração dos séculos não é mais que um dia de festa cujos momentos são todos consagrados a Deus; de que, vindo tudo d'Ele, tudo lhe pertence, tudo deve voltar a Ele; de que, em qualquer parte que estejamos, estamos no seu templo, caminhamos na sua presença, e vivemos n'Ele e d'Ele; de que, quer bebamos, quer comamos, quer façamos outra ação, devemos referir-lha e fazer-lhe o sacrifício dela; de que o amor da verdade e da justiça, que é o amor do mesmo Deus, deve morar na nossa alma assim na alegria como na tristeza, assim na felicidade como na nudez; e de que esta divina chama deve arder continuamente n0 nosso coração, como em um altar mais puro e mais precioso que os altares mais santos e mais magníficos da terra.

A celebração desta festa perpetua que compõe a vida dos justos, e que deverá compor a de todos os homens, não se opõem nem o trabalho manual, nem os empregos mais baixos, nem as obras servis; pois o justo animado da caridade é livre, livre pela liberdade dos filhos de Deus; e nenhuma das suas obras é servil. Quer pode a sua vinha, quer cultive os seus campos ou navegue no mar, não cessa de celebrar essa festa continua dos justos, pois que nã0 cessa, entre essas ocupações, de amar seu Pai celeste e de cantar 0s seus louvores (Clem. Alexand, Strom., 1. VII, n 512.). Se todas essas coisas são vedadas nos dias de festa particulares, é para que os cuidados temporais não sejam obstáculo à meditação das coisas divinas e à oração.

A vida do homem neste mundo é pois uma festa, porém uma festa que ele deve celebrar como o guerreiro no meio dos combates, alcançando continuas vitórias; como o desterrado, caminhando continuamente para a pátria; como um rei caído do trono, procurando com contínuos esforços tornar a subir a ele. Para o Cristão, isto é, para o homem que compreende o seu destino, é pois a festa da vida, se é licito dizê-lo, uma festa paciente e laboriosa. Mas animo, ó homem! Guerreiro desterrado, rei decaído, animo! Para ti virão a seu tempo as palmas, a pátria e a coroa.

***
Mons. Gaume. Catecismo da perseverança, tomo ix, Porto: 1868, pp. 261-264.



Jean Joseph Gaume (1802 - 1879)

sábado, 23 de maio de 2020

Fidelidade à tradição (D. Antônio de Castro Mayer)


“Se a palavra muda, e não é sinônima, naturalmente também o conceito se modifica. Estão no caso os novos termos dos teólogos “aggiornati”, cuja conseqüência é um abalo na própria Fé. Eis que a nova terminologia, de fato, introduz uma nova religião. Não estamos mais no Cristianismo autêntico. Aliás, as inovações não ficam apenas em troca de palavras. Vão mais longe. Na realidade, excitam uma subversão total na Igreja. Como a filosofia moderna sobreestima o homem, a quem faz juiz de todas as coisas, a nova Igreja estabelece, como dissemos, a religião do homem. Elimina tudo quanto possa significar uma imposição à liberdade ou uma repressão à espontaneidade humanas. Desconhece, assim, a queda original e extenua a noção do pecado”. (p. 18)

“(...) o antídoto a tão profunda crise de linguagem, pensamento e ação, só encontramos na fidelidade à tradição”. (p. 18)

“(...) tal é o valor da Tradição, que mesmo as Encíclicas e outros Documentos do Magistério ordinário do Sumo Pontífice, só são infalíveis nos ensinamentos corroborados pela Tradição, ou seja, por uma doutrinação contínua, através de vários Papas e por largo espaço de tempo. De maneira que, o ato do Magistério ordinário de um Papa que colida com o ensinamento caucionado pela Tradição magisterial de vários Papas e por espaço notável de tempo, não deveria ser aceito”. (p. 19)

“Guardemos, pois, com o máximo respeito e atenção, o critério de aferimento para as novidades que surgem na Igreja:
- Ajustam-se elas à Tradição? – São de boa lei.
- Não se ajustam, opõem-se à Tradição, ou a diluem? – Não devem ser aceitas.
Tradição, é certo, não é imobilismo. É crescimento, porém, na mesma linha, na mesma direção, no mesmo sentido, crescimento dos seres vivos que se conservam sempre os mesmos. Por isso mesmo, não se podem considerar tradicionais, formas e costumes que a Igreja não incorporou na exposição de sua doutrina, ou na sua disciplina. A tendência, nesse sentido, foi chamada por Pio XII “reprovável arqueologismo” (Encíclica “Mediator Dei”). Isto posto, tomemos como norma o seguinte princípio: quando é visível que a novidade se afasta da doutrina tradicional, é certo que ela não deve ser admitida”. (p. 21)

Na atual crise da Igreja, podemos dizer que nossa salvação está condicionada ao emprego de todos os meios que preservem a integridade da nossa Fé. Portanto, é necessária, hoje, maior atenção para evitar as ciladas armadas contra a autenticidade de nosso Cristianismo. (p. 22)

Podemos dizer que a Igreja jamais Se achou em crise tão grave e tão radical, como a que hoje alui seus fundamentos desde os seus primeiros alicerces. É sinal de que a proteção de Maria Santíssima se torna mais necessária. A nós compete fazê-la real mediante nossas súplicas à Santa Mãe de Deus. Nesse sentido, renovamos a exortação que fizemos à reza cotidiana do terço do santo Rosário, cuja valia aumentaremos com a imitação das virtudes de que a Virgem Mãe nos dá particular exemplo: a modéstia, o recato, a pureza, a humildade, o espírito de mortificação na renúncia de nós mesmos..
Confiamos que a proteção da Santa Mãe de Deus nos conservará a fidelidade à Tradição na nossa profissão de fé e nas nossas práticas religiosas, como nos hábitos de nossa vida católica. (p. 25)
 ***
D. Antônio de Castro Mayer. Carta Pastoral “Aggiornamento” e Tradição (11.4.1971).


A invasão dos barbáros (don Rafael Gambra)


“Atualmente observamos sacerdotes e guardiões do Templo santo unirem-se à turba dos incendiários da Cidade e dedicarem-se de forma desenfreada à demolição do patrimônio sagrado que eles receberam como depósito, como função. E assim os vemos hoje empenhados em ‘desmistificar’ a fé, em ‘dessacralizar’ o culto além de outras iniciativas contraditórias, ao mesmo tempo em que definem a religião e a Igreja como ‘um serviço à Humanidade. A promoção de uma vaga fraternidade humana, da paz, do desenvolvimento econômico, do bem-estar social e da igualdade são os objetivos explícitos de uma religião apenas de nome e de modo vergonhoso. A imagem ideal do monge macilento e ascético foi substituída pela do clérigo ‘eficaz’ e ativo... Mas, se a primazia da ação encerra a Cidade humana em um círculo sem saída, em cujo centro sorri o Diabo do Fausto, quando essa mesma primazia é aplicada ao Templo o efeito é ainda maior: se o esvazia de sua própria substancia e realidade.
O Templo já não é lugar de contemplação senão de ruído e de subversão, simplesmente porque já não é templo. Assim como a chamada sociedade de consumo e do transporte fácil cria uma atmosfera irrespirável, assim a corrupção do Templo torna impossível a oração pessoal, que é como a respiração da alma. A ruína total e definitiva da antiga Roma se resumiu sempre ‘na entrada dos bárbaros no Capitólio’, quer dizer, no templo supremo da Urbe. Nossa civilização não perece em virtude da ação de bárbaros e estrangeiros, senão que produz ou destila de si mesma os seus próprios bárbaros. Em nossos dias ocorre a invasão desses bárbaros imanentes no Capitólio ou santuário de nossa Cidade, que é a Igreja Católica. Por isso não se trata de uma destruição exterior, a sangue e fogo, senão de uma autodemolição obstinada, silenciosa”.
***

Rafael Gambra Ciudad. Sentido cristiano de la accion, Revista Verbo, ns. 119-120, 1973, pp. 961-962.


Rafael Gambra Ciudad (1920-2004)

Valentes soldados (poesia)


Poesia recitada pelo Reverendo Padre Antonio Fernandes da Silva Queiroz, perante o Exm. e Rvm. Sr. Bispo D. Luiz Antonio dos Santos e os Srs. Seminaristas, e os dignos lentes do seminário episcopal do Ceará (24 de março de 1867), .

*** 
Aos meus colegas no presbiterado.
Sobrii estote, et vigilate,
Quia adversarius vester
Diabolus, tanquam les rugens,
Circuit, quorens quem devoret (S. Pedro, Ep. 1, cap. 5, v.8)


Valentes soldados da nova cruzada,
Estejamos de pé!
Não durma um só bravo, sejamos unidos
- Defenda-se a fé!

E a luva atirada por vis inimigos
Aceita-se e já!
Travemos a luta, que as grandes vitórias
Só Deus é que dá!

Nós somos ministros do Deus das armadas!
Que esforça Sansão!
Se imensas falanges quiserem bater-nos
- Troveje o canhão!

E a luva atirada...

Moisés não tremia na frente dos bravos
Do grão faraó;
Moisés imitemos, oh! Filhos queridos
Do Deus de Jacó!!

E a luva atirada...

E se os nossos vestidos nas lutas renhidas
Cobrimos de pó
Seja isso incentivo – corramos ousados
À vil Jericó!

Que imporá o número de nossos soldados
Imenso não seja?
Se todos sabemos, que as nossas batalhas
Deus é quem peleja!

Quem foi que o mar roxo fechou sobre as hostes
De vis inimigos?
Pois; nós que sabemos de tantos prodígios
Temeremos perigos?

Golias não façam, por grandes que sejam,
Tremerem Davis!
Deus manda seus raios em nosso socorro
Derrubem-se os vis...

Os Neros por terra!... Por terra Voltaires,
Arios, Calvinos!
As armas, se investem, que fortes achamos
Nos Livros divino!


Henriques, Luteros, Cavours, Garibaldis (1)
Renans e Proudons!
Por terra! Guerreiros! Por terra esses ímpios,
com seus esquadrões!!


Os Eutiquios e Budas...
Calquemos aos pés!
Unamo-nos todos – brademos as armas,
- Sigamos fiéis!!

E a luva atirada...
Jesus por nós todos no cume do monte
Morrera na Cruz!
Avante soldados da nova cruzada,
Defenda-se a luz!


Dos Mártires, Apóstolos, de Santos e Virgens
Sejamos imagem;
Morramos por Cristo, com Cristo e no Cristo
Tenhamos coragem!!

Seminário do Ceará, 24 de março de 1867.

(1) Eu sei, que muita gente de paladar delicado há de achar amargo este manjar, isto é, a denominação de ímpios a Cavours, Garibaldi, mas a estes responderei – Roma falou – causa finita est.


A Tolerância Religiosa (Dom Tomás de Aquino)


Após falar do suposto direito de liberdade de culto como direito inalienável, é necessário falar da tolerância, pois a tolerância dos falsos cultos é também doutrina da Igreja. O Estado Católico deve, com efeito, suportar os males que ele não pode suprimir, como é o caso das falsas religiões. Estas podem ser reprimidas e combatidas, mas nem sempre é possível suprimi-las, sobretudo hoje em dia.

O que fazer neste caso? Neste caso as falsas religiões devem ser toleradas. Tolerar não é aprovar nem dar direitos propriamente ditos a essas falsas religiões; só o bem e a verdade podem ser objeto de verdadeiros direitos.

O mesmo deve ser dito da liberdade de expressão. É melhor suportar alguns males do que suscitar outros maiores. Liberdade de expressão, liberdade de ensino: eis liberdades modernas, fundadas em princípios revolucionários.

No entanto, existe uma liberdade de ensino legítima, que fez Santo Alberto Magno e Santo Tomás de Aquino ensinar a filosofia de Aristóteles nas universidades, o que pareceu a alguns abuso de liberdade, e não era, evidentemente. Mas há outra que é maliciosa e pervertedora das almas. Mesmo neste caso, há ocasiões em que se deve tolerar esse mal, enquanto não se pode, por exemplo, fechar certas universidades.

Quanto à sociedade moderna, ela é herdeira da revolução ou mesmo fruto da revolução, mas tem ainda alguns restos de civilização. Enquanto tem esses restos de civilização, ela tem algo de bom; e ela é perversa enquanto herdeira dos revolucionários, os quais não nos trazem nada de bom. O que há de bom na sociedade moderna vem do Catolicismo; o que ela tem de realmente próprio é a revolução, na medida em que se reclamam da Revolução Francesa, da Constituição Americana e da Declaração dos Direitos do Homem.

Que o Imaculado Coração nos ajude a nos preservar dos erros com os quais a Revolução, através da Rússia Soviética e do Ocidente e, sobretudo, da Igreja Conciliar, não cessa de perverter as inteligências, as vontades e os corações de nossos contemporâneos, atingindo nossos familiares e amigos.


Nova Friburgo, 19 de maio de 2020

† Tomás de Aquino


quinta-feira, 21 de maio de 2020

O santo Sacramento da penitência

- Não possuímos morada permanente neste mundo; mas vamos buscando a futura (Hebr 13, 14).
A barquinha da nossa vida navega rumo à eternidade, nosso último destino. A sorte na eternidade pode ser dupla: feliz no céu ou infeliz no inferno, conforme nos encontrou o golpe da morte em estado de graça com Deus ou em estado de inimizade com o Criador, pelo pecado mortal.
O pecado original é tirado da alma pelo lavacro do batismo. Os pecados mortais, cometidos depois do batismo, por via normal, são tirados da alma pelo sacramento da Penitência.
Daí a imensa importância da confissão sacramental. Não será exagero afirmar que para a maior parte dos católicos adultos nela anda a vida ou a morte, o céu ou o inferno.
Pelo pecado grave ficam cerradas ao pecador as portas do céu, assim como pelo pecado original ficaram trancadas as portas do paraíso, do qual foram expulsos Adão e Eva. Ao contrário, pela digna e frutuosa recepção do sacramento da Penitência abrem-se ao penitente as portas do céu, motivo por que a confissão foi denominada, com muito acerto, a chave do paraíso.
Se o pecador tiver só pecados leves, ainda neste caso a confissão sacramental pode ser considerada a chave do paraíso, porque lhe remite as culpas veniais de que se arrependeu, e aumenta-lhe a graça santificante, que é garantia da vida eterna.
- Não possuímos morada permanente neste mundo; mas vamos buscando a futura!.
Ingressamos na eternidade pela porta da morte. Nesta hora suprema, constituirá máximo consolo, se pudermos dizer:
- Minhas confissões foram sempre bem feitas. Esta, derradeira, me abrirá a entrada ao céu!
Nesta convicção, encararemos a morte sem pestanejar. Será o raiar da aurora da vida imortal ! ...
Frequentando os estudos em Paris, Gabriel Garcia Moreno encontrou-se certa noite com amigos que comentavam animadamente um caso recente. Falecera um homem que recusara, até ao último suspiro, os socorros da religião. Uns aprovavam, outros desaprovavam a impenitência obstinada daquele desventurado.
Gabriel Garcia Moreno condenou desassombradamente a contumácia do finado, quando um dos presentes o interpelou abertamente:
"Se tu és partidário da confissão, declarando-te publicamente católico, então dize-nos: quando te confessaste a última vez?”

Este desafio teve o efeito de um raio na alma juvenil de Gabriel Garcia Moreno. Comovido, aterrado, envergonhado, retirou-se da roda de amigos, sem proferir palavra.
Pois a consciência o acusava de ser um retardatário até com a desobriga pascal. Na manhã seguinte, saiu em procura de um sacerdote.
Fez uma confissão geral e o inabalável propósito de confessar-se, regularmente, todos os meses. Mais tarde, foi eleito presidente da república do Equador, conservando inconcusso costume de aproximar-se, mensalmente, do tribunal da Penitência. Mesmo no dia 6 de agosto de 1875, manhã em que Gabriel Garcia Moreno, varado de balas, tombava vítima de horrendo atentado, ele, tinha recebido a sagrada comunhão, após ter antes acusado suas faltas no sacramento da Penitência.
* * *
Dignamente recebida, a confissão sacramental foi, no perpassar dos séculos, para inúmeros cristãos, a chave do paraíso, que lhes abriu as portas do céu! ...
*** 
Frei Benvindo Destéfani, O. F. M. O santo Sacramento da penitência, Petrópolis: Vozes, 1934, pp. 12-15.



Catecismo sobre a salvação (Santo Cura d’Ars)


Há muitos cristãos que nem sequer sabem por que estão no mundo... "Por que foi, ó meu Deus, que me pusestes no mundo? — Para te salvar. — E por que me quereis salvar? — Porque te amo". O bom Deus nos criou e pôs no mundo porque nos ama; quer salvar-nos porque nos ama... Para nos salvarmos é preciso conhecermos, amarmos e servirmos a Deus. Ó bela vida!... Como é belo, como é grande conhecer, amar e servir a Deus! Só isto temos que fazer neste mundo. Tudo o que fizermos fora disso é tempo perdido. É preciso só agir por Deus, por as nossas obras nas Suas Mãos... Devemos dizer ao acordar: "Queria trabalhar hoje por vós, ó meu Deus! Submeter-me-ei, a tudo vindo de Vós, a tudo o que Me enviardes. Ofereço-vos em sacrifício. Mas, meu Deus, eu nada posso sem Vós; ajudai-me!" Oh! Como no momento da morte havemos de lamentar o tempo que tivermos dado aos prazeres, às conversas inúteis, ao repouso em vez de o termos empregado na mortificação, na oração, nas boas obras, em pensar na nossa pobre miséria, em chorar os nossos pobres pecados! É então que vemos que nada fizemos para o Céu. Ó meus filhos, como é triste! Três quartas partes dos cristãos só trabalham para satisfazer este cadáver que vai dentro em breve apodrecer na terra, ao passo que não pensam na sua pobre alma, que deve ser eternamente feliz ou desgraçada. São falhos de espírito e de bom senso: isto faz tremer! Eis aí, pois, esse homem que se atormenta, que se agita, que faz barulho, que quer dominar sobre tudo, que se julga alguma coisa, que parece querer dizer ao sol: "Sai daí: deixa-me iluminar o mundo em teu lugar!". Um dia, esse homem orgulhoso será reduzido quando muito a uma pitada de cinza que será arrastada de riacho em riacho, de Saône em Saône, até ao mar.
Vede, meus filhos, eu penso muitas vezes que nós nos parecemos com esses montinhos de areia que o vento junta no caminho, que volteiam um momentinho e se desfazem imediatamente depois... Nós temos irmãos e irmãs que morreram. Pois bem! Eles estão reduzidos a esse punhadinho de cinza de que falo. As pessoas do mundo dizem que é muito difícil fazer a própria salvação. Entretanto, não há nada mais fácil: Observar os mandamentos de Deus e da Igreja, e evitar os sete pecados capitais; ou então, se quiserdes, fazer o bem e evitar o mal; é só isso. Os bons cristãos que trabalham em salvar a própria alma e em fazer a sua salvação estão sempre felizes e contentes, gozam antecipadamente da felicidade do Céu; serão felizes durante toda a eternidade. Ao passo que os maus cristãos que se condenam são sempre para lastimar; murmuram, são tristes, são infelizes como as pedras, e sê-lo-ão durante toda a eternidade. Vedes que diferença. Eis aqui uma boa regra de conduta: só fazermos aquilo que pudermos oferecer a Deus. Ora, não se lhe podem oferecer maledicências, calúnias, injustiças, cóleras, blasfêmias, impurezas, espetáculos, danças... Entretanto, não se faz senão isso no mundo. Falando das danças, S. Francisco de Sales dizia "que elas são como os cogumelos; que os melhores não valem nada..." As mães bem que dizem: "Oh! Eu velo sobre minhas filhas". Velam-lhes sobre o vestuário, mas não lhes podem velar sobre o coração. Aqueles que fazem dançar na sua casa sobrecarregam-se de uma responsabilidade terrível perante Deus; são responsáveis por todo o mal que se faz, pelos maus pensamentos, pelas maledicências, pelos ciúmes, pelos ódios, pelas vinganças... Ah! Se eles compreendessem bem essa responsabilidade, nunca fariam dançar. Tal qual como os que fazem maus escritos, maus quadros e más estátuas; são responsáveis por todo o mal que esses objetos produzirem durante o tempo que durarem...  Oh! Isto causa perturbação! Vede, meus filhos, é preciso refletir que nós temos uma alma por salvar e uma eternidade que nos aguarda. O mundo, as riquezas, os prazeres, as honras passarão; o Céu e o Inferno jamais passarão. Tomemos, pois, cuidado. Os santos nem todos começaram bem, mas todos acabaram bem. Nós começamos mal, pois acabemos bem, e nos iremos juntar a eles no Céu.

 ***
Abbé A. Monnin. Espírito do Cura d’Ars: nos seus catecismos, homilias e conversação, Petrópolis: Vozes, 1959, p. 17.

Santo Cura d’Ars (1786-1859)

sábado, 16 de maio de 2020

Levantem-se e trovejem contra a mentira e o erro...


As linhas abaixo representam a voz de um autêntico Pastor que se levanta intimorata, altiva, em tudo diferente dos discursos tíbios e pouco claros dos Bispos de nossos dias, nos quais o erro não é combatido e, por consequência, a verdade não é proclamada. Por outro lado, é a mesma altivez, a mesma combatividade que observamos em um Mons. Lefebvre, em um d. Antônio de Castro Mayer e em um Pe. Calmel.

***
Avante, pois, mocidade, não recueis um só passo – avante seminaristas.
- E nós colegas no Presbiterado – nós também, demos desenvolvimentos às nossas ideias, inspiremo-nos e afaçamo-nos às lutas tão necessárias nestes últimos tempos em que a impiedade disfarçada, lobo com formosa pele de cordeiro, se avança no meio de aplausos e repetidos vivas dos quatro ventos, pela estrada larga da perdição, combatendo os fortes, ilaqueando os fracos, e semeando entre todos a semente pestilenta da perturbação e da descrença, do ódio e da cobiça. Oh! Sim, fortaleçamo-nos e levantemo-nos todos contra esta filosofia ímpia, que teve origem na Alemanha, e se acha enraizada em quase todos os países do mundo.
Quando as tempestades se levantam e as ondas se empolam, os marinheiros não dormem, nem esperam pelo brado de alerta do timoneiro.
E pois, nós que assumimos o mais sublime estado de todos os estados, esse a que um luseiro da Igreja chama o mais augusto em seu princípio, o mais nobre em seu exercício, e o mais santo em seus fins. Nós diretores do barco, nós a quem Deus santificou e mandou ao mundo, nós herdeiros daqueles a quem Jesus enviou como cordeirinhos no meio dos Lobos (S. M. Cap. 10, V. 15) não devemos ficar estacionários ante a perspectiva aterradora, que se nos apresenta.
Estejamos pois de atalaia... Armeno-nos contra todas as invasões dos poderes destruidores, contra todas as doutrinas dos modernos Voltaires.
Não durma um filho quando aflita e consternada geme a sua mãe, porque isto sobre ser uma vergonha, é um crime horripilante! Consentir um sacerdote que a falta de zelo e de cultura pereça a vinha do Senhor é uma hediondez! Ora pois, meus colegas, não nos deitemos a dormir, para não sermos o filho da maldição; nem nos conservemos em criminoso ócio para não definhar a vinha do Senhor.
Nós somos o sal da terra, mas, pergunta o Apóstolo, se o sal se desvanecer, com que se salgará?
Se o sal se desvanecer... ai de nós! Senhores! Não haverá nada em derredor que não seja corrupção se o sal se desvanecer... Meu Deus! Nem pensar.
Houve um tempo, senhores, em que o sacerdote brasileiro dormiu, e esse tempo criou a situação dificílima em que nos achamos. O joio tomou o lugar do trigo, a indiferença substituiu o fervor, e a morte pôs-se em lugar da vida.
Senhores, é preciso reagir mui seriamente contra este estado – comecemos desde já.
Os seminaristas sejam os pontos de apoio para a reação. Os Bispos já se tem levantado, levantem-se também todos os seminaristas. Levantem-se e trovejem contra a mentira e o erro, porque mentira e erro não resistem às armas invencíveis da verdade.
A luz brilha no meio das trevas. Que esperança! Cada um de nós seja um luseiro brilhante.
Quem não puder subir à tribuna, sentem-se no confessionário, quem não puder edificar com a palavra edifique com o exemplo. Cada um tome o seu lugar; e se for preciso derramar nosso sangue, façamo-lo, novos mártires, jorrar de nossas veias.
Soframos tudo; mas militemos sempre nas fileiras de Cristo.
Encarreguemo-nos da cultura da vinha (por Deus!), não consintamos que ela morra ou descresça a nossas vistas!
Unamo-nos e trabalhemos.
União e trabalho... eis tudo.
A terra terá bênçãos para os trabalhadores das vinhas que perseveram.
No céu ocuparemos a cadeira do justo; e Deus estará conosco em toda parte; não somos nós que dissemos, Jesus Cristo o prometeu solenemente.
Sigamos a Jesus Cristo, ele é o caminho, a verdade e a vida, via veritas et vita.
Dixi.
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Seminário episcopal do Ceará, 24 de março de 1867.

Rvm. Sr. Bispo D. Luiz Antonio dos Santos (1817-1891).
Indicado para o Bispado do Ceará, por Decreto Imperial de 31 de janeiro de 1859 e confirmado por Pio IX em 28 de setembro de 1860, sagrado aos 14 de abril de 1861.