Tomei nojo ao vocábulo,
outrora límpido e belo, e só o empregarei para designar os de Platão ou
semelhantes. Certamente o amigo quer-me perguntar se espero “melhores relações”
ou “menos atritos” ou “maior entendimento” entre o novo governo e os
eclesiásticos que nos últimos anos tantas vezes perturbaram a ordem pública a
favor de uma caricatura de “justiça social” que hoje só pode ser engolida pelos
tolos irremediavelmente tolos.
Posta a pergunta
nesses termos, posso ainda simplificá-la a bem da clareza: terei eu esperanças
de melhor comportamento cívico da CNBB e dos eclesiásticos desordeiros por
conta própria?
Mesmo sem ser profeta
nem adivinho, esboço o meu temor: não acredito no progresso ou no
amadurecimento da maioria episcopal que fala a língua das esquerdas e pensa que
pensa pelo pensamento delas. Não vejo possibilidade de emenda onde não se vê o
mais débil sinal de contrição ou atrição. Eles estão satisfeitos e felizes. Depois
de terem engolido a ideia central: que a Igreja deve acompanhar as andanças do “mundo”
para não ficar atrasada; depois de terem achado luminosas as “aberturas” para
as ruas nos momentos e lugares de maior perversão; depois de terem acreditado
que a razão está com aqueles que vinte anos atrás eram inimigos da Igreja; depois
de um novo credo descobrem entusiasmados que estão aqui, como “Igreja”, para
agradar aos homens até o desprezo de Deus...
As pessoas que fazem
essas sucessivas descobertas deveriam, decentemente, aliviar-nos de suas
presenças nos lugares católicos. Deveriam ser mais sinceras. Enganam-nos elas
tão deslavadamente? Ou engam-se primeiro a si mesmas para depois nos enganarem?
Não sei. A profissão de fé que fazem de mil modos todos os dias, sem incluir a
singela declaração “não sou católico”, é todavia equivalente. Se eu disser que
um Tal não é católico não me acusem de juízo temerário. Longe de mim essa
pretensão de sondar os rins e o coração. Direito que Dom Tal tantas e tantas
vezes declarou aos quatro-ventos suas ideias não-católicas que, vencido e
fatigado, me inclino dizendo: - Acredito, acredito...
***
Gustavo Corção. Do artigo “Melhores Relações”,
em “O Globo”, 7.3.1974.
(1896-1978)
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