Se os franceses, com razão,
ufanam-se de contar com um historiador da estatura de um Augustin Cochin, cujos
estudos sobre as tramas das lojas maçônicas e das “sociedades de pensamento” ainda hoje não foram superados, podemos
nós também manifestar o mesmo sentimento em relação ao notável Eugênio
Vilhena de Moraes, autor do excerto abaixo transcrito, extraído de
magistral conferência pronunciada no Instituto Histórico e Geográfico do
Brasil, do qual era membro. Profundo conhecedor das origens católicas da
nacionalidade, dedicou-se também Vilhena de Moraes ao estudo de suas figuras
mais relevantes, entre as quais destacam-se D. Vital e o grande Luís Alves de Lima e Silva, o Duque de Caixas (“Duque de Ferro”). Ao
seu empenho e o de sua esposa se deve uma edição, em 1945, do “Livro
da família: ou explicação dos deveres domésticos segundo as normas da razão e
do Cristianismo”, do grande bispo
paraense, amigo de D. Vital, D. Antônio
de Macedo Costa. Ainda publicaremos outros excertos da conferência acima referida.
****
“Que afeto ou que virtude –
interrogava um grande bispo brasileiro – mais credor das bênçãos de uma
religião fundada na caridade, que o amor da pátria, que os antigos chamavam
Charitas patrii soli, o amor da sua independência, dos seus direitos, e da sua
grandeza, sentimento irresistível, que o mesmo autor da natureza gravou no
fundo dos nossos corações?
Os livros santos estão cheios de
sublimes cânticos, e magnificas descrições das brilhantes solenidades com que a
nação celebrava, e transmitia aos seus vindouros, a lembrança das memoráveis
épocas da sua liberdade, assim como dos patrióticos suspiros, com que os
cativos da Babilônia se compraziam até na recordação das mesmas pedras da sua
infeliz pátria – ‘Quoniam placuerunt servis tuis lapides ejus, et terrae ejus
miserabuntur’” (Dom Romualdo Seixas, arcebispo da
Bahia, metropolitano do brasil – Pastoral constituindo santificado o dia dois
de julho [26 de junho de 1830]).
Realmente. A própria
Virgem Santíssima entoou no Magnificat
um cântico de ação de graças ao Senhor pelos benefícios derramados sobre o povo
de Israel. O Divino Salvador quis, em pessoa, pregar primeiramente aos seus
compatriotas, sobre cuja desolação e ruína derramou lágrimas, entrando em
Jerusalém, nas vésperas da sua Paixão. “Espargiu
seu sangue, disse Bossuet, com um olhar
particular para a sua nação, e oferecendo o grande sacrifício que devia ser a
expiação de todo o Universo, quis que o amor da pátria tivesse também aí o seu
lugar” (Bossuet – Politique tirée de l’Ecriture sainte, L. I,
artigo VI.)
(...)
País descoberto,
povoado, civilizado à sombra a cruz, não admira tenha tido o Brasil por
primeiros patriotas os seus primeiros missionários apostólicos. Tão abandonada
que até o nome perdera, adotou generosamente a Companhia de Jesus a nova terra,
para criá-la ao seio, não como nutriz mercenária, mas com entranhas
piedosíssimas de mãe. Ainda mais que o poder régio, soube ela educá-la,
imprimindo-lhe ao caráter esse cunho indelével que representa até hoje a maior
segurança da realização dos seus gloriosos destinos. Manoel da Nóbrega,
Aspilcueta Navarro, José de Anchieta, eis aí entre outros muitos os nomes dos
primeiros patriotas que teve a nossa terra.
Pouco importa não
tivesse aberto os olhos sob as fulgurações do Cruzeiro o heroico missionário,
braço forte dos Sás, a respeito do qual disse com razão o protestante Southey:
“não há ninguém a quem deva o Brasil tantos e tão permanentes serviços”, ou
aquele outro grande condutor de povos, a um tempo missionário, poeta,
historiador, pedagogo e linguista, fundador de cidades, que consumiu cinquenta
anos de existência a labutar sem tréguas, pela pátria que adotada.
Estremeciam-na todos,
como própria, essa nova terra e levantavam clamores contra a desafeição geral
dos colonos.
*****
Eugênio Vilhena de Moraes. O Patriotismo e o Clero no Brasil, Revista do IHGB, Tomo 99-Vol.
153, 1926, p. 113-114.
E. Vilhena de Moraes nasceu em Campanha,
MG, em 2 de fevereiro de 1887, e faleceu no Rio de Janeiro, em 31 de outubro de
1981.
Nenhum comentário:
Postar um comentário