sábado, 5 de setembro de 2020

Pastoral contra o alistamento dos fiéis na seita maçônica - D. Joaquim Gonçalves de Azevedo, Bispo de Goiás (1876)


Pastoral
D. JOAQUIM GONÇALVES DE AZEVEDO (1814 — 1879), por mercê de Deus e da Santa Sé Apostólica, Bispo de Goiás.

Aos nossos muito amados diocesanos, saúdo, paz e benção cm Jesus Cristo Nosso Divino Redentor.

Quando nós estávamos na firme convicção, amados filhos, de que o bom senso, o desejo da paz e a razão bem esclarecida pela ruidosa luta religiosa, que apareceu na nossa pátria, tivesse posto a todos os nossos diocesanos fora da dúvida de que a maçonaria é uma seita inimiga da Religião Cristã, soubemos com muito pesar, que algumas pessoas da capital se alistaram nela com grande escândalo e talvez perdição de muitas almas piedosas.
Pesa-nos a pena, amados filhos, ao escrever-vos esta carta: arrazam-se-nos os olhos de lágrimas ao fazermos ao mundo católico esta denuncia tão desairosa dos sentimentos religiosos desses nossos queridos filhos, que sempre viveram nos braços da Santa Igreja de Jesus Cristo: desses nossos amigos, que agora esqueceram a religião, no seio da qual nasceram e tinham vivido em obediência aos seus pastores espirituais, e na prática das virtudes cristãs, servindo de exemplo aos fiéis em cuja comunhão estavam pela profissão de fé, jurada no batismo.
Responsáveis como somos pela salvação das almas, não podemos deixar de levantar a nossa voz para vos dizer que erradamente caminham no negócio da salvação eterna todos aqueles que se filiam na maçonaria, seita que se acha legitima e competentemente condenada com uma excomunhão lançada pelos Sumos Pontífices, em virtude do poder que lhes foi dado por Nosso Senhor Jesus Cristo, quando disse a S. Pedro: - tudo aquilo que ligam sobre a terra será lambem ligado no céu - excomunhão motivada pelo fim a que se destina esta seita, subversiva da boa ordem, moral evangélica e religião santa que professamos.
Não tomamos a tarefa de provar aqui o fim da maçonaria, porque todos sabem que ela é contra a Religião Cristã, e só não enxergam o alvo, ao qual se dirigem os seus ataques, aqueles que não o querem, realizando-se neles o adagio de que: o pior cego é o que não quer ver.
Sim, amados filhos! Estão bem manifestos e postos ao alcance de todos e correndo de mão em mão os documentos mais autênticos, nos quais não se oculta o espirito quo anima aos da seita, em qualquer parte do mundo em que estejam; e quando não houvessem estas provas, bastaria a linguagem dos membros que se mostram mais desenvolvidos nos seus segredos, ou que se ostentam mais dedicados. Blasfemam contra o Papa, cuja autoridade não reconhecem; contra os Bispos, cuja doutrina e ensino de obediência recusam; contra os padres, cuja presença lhes lembra os terríveis juízos do Deus; e contra os fieis ortodoxos, cuja conduta os envergonha e confunde. Só se ocupam das cousas terrenas, e não querem a lei de Deus, que se opõe aos desejos dos seus corações carnais. Negam a revolução e combatem contra a Igreja estabelecida por Nosso Senhor Jesus Cristo. Enganam-se, porém, porque a palavra de Deus não falha.
Eles serão confundidos, amados filhos, e Jesus Cristo reinará para sempre no mundo, que conquistou com a sua Paixão e Morte. Ele é o filho Unigênito de Deus, e como tal não se engana nem nos pode enganar, e foi ele quem disse estas palavras de confiança que animam ao verdadeiro cristão ... edificarei a minha Igreja e as portas do inferno não prevalecerão contra ela - ... eis que eu estarei convosco em todos os dias até a consumação dos séculos - ... o céu e a terra passarão, as minhas palavras, porém não passarão.
Não supomos, contudo, nem mesmo podemos crer que estes nossos diocesanos, que se fizeram maçons, sejam do número desses espíritos fortes, desses filósofos libertinos, desses racionalistas ou deístas, que negam a revelação e a Providência Divina, tendo a Deus por um Ente apático, que não se ocupa deste mundo, não: fazemos justiça aos seus sentimentos religiosos, à sua conduta moral, e a outras qualidades que a impiedade destrói nos corações para plantar neles somente o que é mundano.
Não podemos, todavia, amados filhos, deixar de estranhar a conduta de todos aqueles que se alistam nesta seita. Fazemos certamente com isto uma violência ao nosso coração de pai espiritual e de amigo; porém o dever, o melindre da nossa consciência, a responsabilidade perante Deus e a Igreja Católica, e mesmo o amor e caridade que nutrimos por todos vós, nos forçam a este ato. Somos, apesar da nossa indignidade, o legitimo Delegado do Jesus Cristo no meio de vós, e não podemos sem prevaricação do nosso cargo ocultar os vossos erros, já que estamos postos pelo Espírito Santo para anunciar ao povo fiel os seus delitos, afim de que ele se tire do pecado e viva na graça de Deus.
Nenhuma desculpa pode coonestar a um verdadeiro cristão e bom político na presente época a sua entrada para a maçonaria, quer diga que nunca deixará a sua religião, quer afirme que só tem em vista a proteção que esta seita dá aos seus adeptos.
Certamente, amados filhos, conheceras leis da Igreja de Jesus Cristo na qualidade de seu membro; saber que a uniformidade de pensamento sobre os dogmas, mistérios, doutrina e costumes faz o ponto principal do seu espirito; estar certo de que a obediência à mesma Igreja é que constituí a sua força, escorada na crença da sua estabilidade prometida pelo Salvador do mundo, e ir assentar praça nas fileiras que combatem a esta uniformidade, e que se empenham em vão por desmentir a palavra divina, é manifestar desobediência e rebeldia contra a Santa Igreja, é por si mesmo pôr-se fora da unidade, é deixar de participar dos frutos espirituais que constituem a sua principal riqueza, e que são a escada mais firme e mais fácil para subir ao céu.
Deixar de procurar e insinuar a proteção legitima que nos garante a nossa carta magna e as leis por que se rege a nação, para ir mendiga-la bastarda em uma associação secreta, que não é permitida pelas mesmas leis, e apenas tolerada com escândalo de Iodos, que desprevenidos sabem avaliar o verdadeiro mérito, e desejam a imparcialidade na administração da justiça e distribuição dos cargos; filiar-se em uma associação, que como é sabido, se ostenta em todo o mundo um estado dentro do estado, para proteger unicamente os seus contra o direito, a justiça e a razão: é a maior das desmoralizações, pois indica de antemão ou homizio, ou proteção à impunidade, ou atropelo ao direito; é afrontar a integridade dos juízes e corrompe-los; é desvirtuar a instituição do júri e arruinar a liberdade e a pátria; é fazer perder a ideia do dever; é nutrir o empenho, fonte principal da decadência do mérito baseado na moral, no estudo e verdadeira dedicação; é fazer desaparecer  emulação que eleva o espirito e forma os grandes gênios, que honram a pátria.
Não nos passou desapercebida, amados filhos, a instalação da loja maçônica na capital, no dia 16 de Abril do corrente ano; não: porém a prova dada por todas as pessoas de ambos os sexos e de todas as idades, pela ocasião do Jubileu do ano santo, tinha posto no nosso animo a mais firme confiança de que ela não se comporia senão dos seus instituidores; e estávamos certos do que nenhum dos nossos diocesanos desta província de Goiás se deixaria arrastar por circunstância alguma, por mais vantajosos que fossem os resultados, para se filiar em uma seita que procura destruir o trono e o altar; e que subvertendo a moral evangélica, pretende plantar a descrença das verdades eternas, das quais a primeira é a vida futura ou no céu com Deus e seus santos, ou no inferno com Satanás o seus anjos.
Sim, amados filhos, ao vermos os templos da nossa capital regurgitando de fieis, onde as principais pessoas se mostravam compenetradas da verdade das indulgências; onde os confessionários e a sagrada mesa manifestavam todos os dias abundante fé; ao vermos ostentarem-se brilhantes as visitas das igrejas pelo quase total concurso dos moradores da capital, o nosso coração se expandia em ações de graça ao Pai das Misericórdias; e ao sabermos dos grandes frutos colhidos nas diversas freguesias do bispado pelas inúmeras reconciliações e extinção das desafeições pessoais, pelos casamentos para reparar o escândalo e por motivos de consciência, pelas restituições e muitas renuncias da maçonaria, bendizíamos o Santo Nome do Senhor e estávamos bem persuadidos de que a fé nesta parte do rebanho de Jesus Cristo, confiada aos nossos fracos cuidados, só merecia louvores da nossa parte, e esperávamos a oportunidade para apresentar ao mundo inteiro a nossa província, como a única que não tinha querido alistar-se debaixo do estandarte do erro, que tem combatido, combate e há de combater contra a verdade.
Fomos iludidos.
Hoje forçosamente e cheios de confusão vos dirigimos estas nossas letras para confessar-vos o nosso engano pela boa fé em que estávamos, e avisar do grande risco que corre a salvação eterna de todo aquele que faz parte da maçonaria.
O pastor que vos está falando, não vos é desconhecido. A sua vida no meio de vós por espaço de nove anos sempre vos esteve bem patente; ele viveu para vós sem distinção de pessoa; nenhuma honra, nenhuma ambição nem glória regulou as suas ações; só o vosso bem, quer espiritual, quer temporal, era o móvel que dirigia os seus atos; pois a única cousa que tinha em vista era o céu, era a salvação das almas, era o amor do próximo, era o desejo de ser útil à pátria. Acautelai-vos, amados filhos, não vos deixeis seduzir por promessas enganadoras de vantagens terrestres, que, se algumas vezes se têm realizado, é com o fim especioso de mais facilmente iludir a simplicidade e boa-fé; não troqueis os bons caducos do mundo pela bem-aventurança eterna.
Sabei que, assim como o vosso nome foi escrito no céu no livro da vida quando fostes regenerados pelas águas do batismo, assim também ele é riscado, logo que deixais de ouvir a Igreja de Deus para dardes ouvido a falsos profetas, anunciados pelo Apóstolo S. Paulo por estas palavras: - haverá tempo em que os homens não quererão seguir a Ira doutrina; mas anelando achar meio que a destrua, buscarão mestres segundo a seu coração corrupto; e, não dando mais atenção à verdade, estarão prontos a ouvir fábulas, que os lisonjeiem.
Quem não leve a fraqueza de dar o seu momo para se alistar na maçonaria, se conserve fiel; e o que teve a infelicidade de filiar-se nela por qualquer circunstância, renuncie o seu erro, e torne a entrar para a Igreja Santa de Jesus Cristo, da qual está legitimamente excluído.
 A obediência, amados filhos, é um dos mais fortes elos da cadeia que nos une a Jesus Cristo. Ligando ela os fiéis aos seus legítimos pastores, os conserva como membros do corpo da Igreja, cuja cabeça é o mesmo Jesus Cristo; e sem ela não se pode ser senão um apóstata, um herege, um renegado. É só dentro da barca de Pedro e bem chegado ao piloto, pela obediência ao seu ensino infalível, que podemos contar certa a nossa salvação eterna; porque fora desta barca não há a comunhão dos bens espirituais; não há a remissão dos pecados; não há a comunicação dos frutos da Paixão e Morto do Salvador por meio dos Sacramentos; não há senão urna presunção temerária de poder salvar-se sem merecimentos.
Certamente; é só nesta verdadeira arca de Noé que podemos confiar na certeza da vida eterna; aqueles que não se acham dentro dela, estão no dilúvio das paixões, na inundação dos erros, e vagam na superfície do pélago imenso dos prazeres carnais e gozos terrenos, que fazem o homem esquecer a sua origem divina.
Não desprezeis, amados filhos e amigos, que vos tendes posto fora da verdadeira Igreja; não desprezeis o chamamento da graça de Deus por meio do nosso ministério. Lembrai-vos que o juízo de Deus é infalível, e ali ninguém poderá alegar ignorância, porque Ele é conhecedor dos mais recônditos segredos do coração.
Se acreditais na eternidade, como sempre destes provas; se tendes a Deus como um Ente de infinita justiça; se credes em Jesus Cristo- Filho Unigênito do Eterno Pai, que veio ao mundo, se fez homem e aqui estabeleceu a sua Igreja, renunciai o vosso erro e tornai a entrar para esta Igreja, da qual estais legitimamente excluídos, com risco da vossa salvação eterna.
E como não tínhamos ainda feito publicar o Breve do Nosso Sumo Pontífice Pio IX, que principia - Quamquam dolores, agora transcrevemos a sua parte essencial para conhecimento de todos, e para que se possam aproveitar da facilidade que o mesmo Sumo Pontífice proporciona para renunciarem a maçonaria aqueles que infelizmente se têm conservado nela.
Eis as suas palavras textuais:

Portanto, lembrados nós que fazemos as vezes d'Aquele que não veio chamar os justos - mas sim os pecadores, julgamos dever seguir os passos do nosso já citado predecessor Leão XII, e por isso suspendemos pelo espaço de um ano inteiro, depois que forem conhecidas estas nossas letras, a reserva das censuras nas quais têm incorrido os que deram o seu nome a essas seitas, e concedemos que eles possam ser absolvidos das mesmas censuras por qualquer confessor, com tanto que seja do número daqueles que são aprovados pelos Ordinários dos lugares em que assistem.
E, se nem este remédio de clemencia afastar os culpados   do nefário propósito, nem retraí-los de seu gravíssimo crime, é nossa vontade que, passado o dito espaço de  um ano, imediatamente reviva a reserva das censuras, que com a nossa autoridade apostólica de novo confirmamos, declarando expressamente, que nenhum, sem exceção, dos adeptos de tais sociedades fica imune destas penas espirituais, qualquer que seja o pretexto que alegarem, ou de boa-fé, ou de extrínseca aparência de probidade, que as referidas seitas parecem ostentar; portanto todos, sem exceção, correm o mesmo perigo de condenação eterna, enquanto aderirem a tais sociedades.

Nada mais fácil, amados filhos e amigos do que aproveitar-vos deste indulto. Não se exige, um ato que seja superior às vossas forças nem uma pública e solene profissão de fé que humilhe o vosso amor próprio, nem tão pouco ação alguma que tenha por antagonista o respeito humano. Uma simples e secreta confissão das vossas culpas a Deus, por intermédio do seu ministro, com aquela humildade própria de quem sabe conhecer a majestade e bondade infinita do Salvador do mundo, a quem tem ofendido, com declaração do seu erro e propósito expresso de não voltar mais a ele; eis quanto a benignidade do Vigário de Nosso Senhor Jesus Cristo exige para ficardes livres da excomunhão, que vos priva dos bens da Igreja em ordem à salvação eterna.
Ó que consolação não será para o vosso Pastor, pai espiritual r amigo, contar de certo, desde este mundo, com a vossa companhia na corte celestial!
Não vos deixeis arrastar pelos desvarios daqueles, que com a presunção de singularidade, negam a Deus e zombam dos santos, da Virgem, da Igreja, do culto, dos ministros da religião e de tudo que é o objeto da veneração e respeitos dos demais; desses que não são católicos apostólicos romanos, que não são protestantes, nem judeus, nem maometanos, e dos quais ninguém sabe qual é a religião, a não ser a dos gozos terrestres, sem nunca se lembrarem que hão de morrer e ser julgados pelo Redentor do mundo.
Eles estão bem descritos, amados filhos, pelo Apóstolo S. Paulo no primeiro capítulo da sua carta aos Romanos. Vós porém, atendei somente à vossa salvação eterna.
Sede os primeiros nas vossas famílias a vos mostrardes piedosos, para que o vosso bom exemplo atraia sobre ela as bênçãos do céu, e possais gozar da paz de consciência, reputados pelos vossos como amigos de Deus no meio deles.
O mundo e o demônio têm o seu partido que combate contra Deus e seus filhos; deixai-os. Procurai que em vossas famílias, pela qual sois responsáveis perante Deus, a Igreja e a pátria, se dê o exemplo das virtudes cristãs, que constituem o verdadeiro progresso nesta vida e asseguram a bem-aventurança na outra.
E vós, filhos-família, que por infelicidade vos tenhais inscrito também nas sociedades secretas, sabei que as lágrimas das vossas piedosas mães são tantas maldições quantas aprouver a Deus lançar sobre vós.
É certo que os seus corações de mães não querem para vós senão a felicidade; mas deles não dependerá a vontade de Deus, quando pretender vingar não só a desobediência à sua Igreja, como o desprezo para com a maternidade, que representa o mesmo Deus.
Por mais ufanos que pareçais, levados pelo vigor da vossa mocidade, não se riscará da vossa alma o sinete da reprovação de Deus pelo vosso proceder menos respeitoso.
Deixai a carreira do crime e procurai somente conseguir um futuro debaixo dos auspícios do céu, que vos possa garantir meios para socorrerdes aos da vossa família, que tem os olhos postos em vós, como única esperança para o seu bem-estar neste mundo. Declaramos que todos os sacerdotes, por nós aprovados, podem absolver aos que estiverem compreendidos na sobredita censura, e marcamos o prazo do ano concedido pelo Sumo Pontífice, a contar da data desta. E para que chegue ao conhecimento de todos esta nossa carta pastoral, mandamos aos Rvds. Vigários e curas a leiam à estação da missa paroquial, registrando-a no livro competente.

Dada em a nossa residência episcopal de Goiás, aos 10 de outubro de 1876.
†Joaquim, Bispo de Goiás.

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